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Arte e ciência: duas irmãs

Carlos Gerbase
Zero Hora, 31 outubro 2017

Meu pai era médico, minha mãe, dona de casa. Tiveram duas filhas, ambas médicas, e quatro filhos: dois engenheiros, um médico e eu, a coisa mais parecida com um artista que surgiu nessa respeitável prole. O que aconteceu comigo? Alguma mutação inesperada em meu DNA? É difícil falar em ambiente e educação, já que os seis filhos e filhas percorreram trajetórias bem semelhantes na infância e na adolescência. Mas não leram exatamente os mesmos livros, nem ouviram os mesmos discos, nem foram nos mesmos bailes. E, como diz a sabedoria popular, os bailes é que estragam as pessoas.

O mais provável é que tenha sido um pouco de tudo. Algum evento poderoso de meu passado – ler A chave do tamanho, de Monteiro Lobato, dançar um compacto de Chuck Berry, ou assistir a O Professor Aloprado prestando mais atenção em Stella Stevens do que em Jerry Lewis – interagiu com os mecanismos genéticos que fabricavam minha personalidade, e o resultado é esse “eu” que carrego hoje, para o bem e para o mal. Pronto! Acabo de encontrar uma explicação científica para minha tendência artística.

Mas o caminho inverso também é comum. Minha irmã Maria, médica e cientista, faz vídeos lindos das suas viagens. Meu irmão Zeca, engenheiro mecânico, é um fotógrafo incrível. Meu irmão Luiz, engenheiro eletrônico, agora é piloto de drone e conta histórias usando alta tecnologia. Minha irmã Andréa, dermatologista, é uma colecionadora de antiguidades. Pra completar, meu irmão Antonio, médico especialista em saúde pública, inicia sua mostra “Relevos Oníricos – Monotipias” no próximo dia 6, às 19h, na Galeria de Arte Paulo Capelari (Rua Cel. Bordini, 665). Aposto que o Dr. José e a Dona Léa nunca cogitaram em colocar no mundo tantos artistas.

O físico David Bohm explica que tanto o artista quanto o cientista têm necessidade de “descobrir e criar algo inteiro, belo e harmonioso. No fundo, é o que um grande número de pessoas em todas as esferas da vida buscam quando tentam escapar da monótona rotina diária.” Arte e ciência, assim, são duas irmãs ocupadas com a mesma tarefa: substituir o tédio pela criação. E nós, Gerbases, vamos nos ocupando também. Pelo menos enquanto não chega a hora do próximo baile.

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